A Associação 25 de Abril não participará este ano, pela primeira vez, nas celebrações oficiais da Revolução dos Cravos por considerar que «a linha política seguida pelo actual poder político deixou de reflectir o regime democrático herdeiro do 25 de Abril».
O anúncio foi feito hoje em Lisboa pela direcção da associação, de que fazem parte alguns dos chamados «Capitães de Abril».
«A linha política seguida pelo actual poder político deixou de reflectir o
regime democrático herdeiro do 25 de Abril configurado na Constituição da
República Portuguesa», lê-se no texto do manifesto «Abril não desarma», lido
hoje, em Lisboa, aos jornalistas e a uma assembleia de associados pelo coronel
Vasco Lourenço.
«O poder político que actualmente governa Portugal configura um outro ciclo
político que está contra o 25 de Abril, os seus ideais e os seus valores. Em
conformidade, a Associação 25 de Baril anuncia que não participará nos actos
oficiais nacionais evocativos do 38.º aniversário do 25 de Abril», lê-se no
texto.
O manifesto, lido pelo presidente da associação, esclarece que, porém, a
Associação «participará nas comemorações populares e outros actos locais de
celebração» da revolução de 1974, assim como «continuará a evocar e a comemorar
o 25 de Abril numa perspectiva de festa pela acção libertadora e numa
perspectiva de luta pela realização dos seus ideais, tendo em consideração a
autonomia de decisão e escolha dos cidadãos, nas suas múltiplas expressões."
«Neste momento difícil para Portugal», os subscritores do manifesto deixam
também um apelo «ao povo português e a todas as suas expressões organizadas para
que se mobilizem e ajam, em unidade patriótica, para salvar Portugal, a
liberdade, a democracia».
Os militares ressalvam que esta «atitude não visa as instituições de
soberania democráticas, não pretendendo confundi-las com os que são seus
titulares e exercem o poder», até porque consideram que «os problemas da
democracia se resolvem com mais democracia».
«Também por isso, a Associação 25 de Abril e, especificamente, os militares
de Abril, proclamam que, hoje como ontem, não pretendem assumir qualquer
protagonismo político», lê-se no texto, que sublinha ainda que os subscritores
têm «plena consciência da importância da instituição militar, como recurso
derradeiro nas encruzilhadas decisivas da História».
«Por isso, declaramos a nossa confiança em que a mesma saberá manter-se
firme, em defesa do seu país e do seu povo», lê-se no texto.
No final da leitura do manifesto, em resposta a questões dos jornalistas,
Vasco Lourenço disse que a associação não quer com estas palavras apelar a uma
intervenção militar: «De maneira nenhuma, confiamos em que [a instituição
militar] saiba comportar-se e não intervenha fora da democracia. Longe de nós
qualquer apelo à intervenção militar, antes pelo contrário», afirmou.
Neste manifesto, que foi feito pela associação, mas «fundamentalmente pelos
militares de Abril», nas palavras de Vasco Lourenço, são várias as críticas ao
poder político, começando por considerar que «o contrato social estabelecido na
Constituição da República Portuguesa foi rompido pelo poder».
«As medidas e sacrifícios impostos aos cidadãos portugueses ultrapassaram os
limites do suportável. Condições inaceitáveis de segurança e bem-estar social
atingem a dignidade da pessoa humana», prossegue o texto, que considera que «o
rumo político seguido protege os privilégios, agrava a pobreza e a exclusão
social, desvaloriza o trabalho».
Para os militares de Abril, Portugal não tem uma «justiça capaz» e para os
«dirigentes políticos» a «ética é palavra vã», fazendo do país aquele que tem
maiores desigualdades sociais dentro da União Europeia.
A postura nacional no seio da Europa e também no quadro da assistência
financeira externa é outra das críticas apontadas pela Associação 25 de Abril:
«Portugal não tem sido respeitado entre iguais, na construção institucional
comum, a União Europeia. Portugal é tratado com arrogância por poderes externos,
o que os nossos governantes aceitam sem protesto e com a auto-satisfação dos
subservientes. O nosso estatuto real é hoje o de um 'protectorado', com
dirigentes sem capacidade autónoma de decisão nos nossos destinos».
Foi por causa deste cenário que os militares de Abril sentiram «o dever de
tomar uma posição cívica e política no quadro da Constituição da República», uma
«posição clara contra a iniquidade, o medo e conformismo» que consideram estarem
a instalar-se na sociedade portuguesa.
Lusa/SOL
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