"Sei que estás em festa, pá
Fico contente
E enquanto estou ausente
Guarda um cravo para mim".
Tanto mar - Chico Buarque
No dia 25 de abril é comemorado os 30 anos da Revolução dos Cravos que pôs fim ao período salazarista com a derrubada de Marcello Caetano. Portugal, hoje membro da Comunidade Européia, era um país atrasado em relação ao continente. O país de Camões não vivia o melhor momento de sua história, o último império colonial da Europa pagava caro por este título. Angola, Moçambique e Guiné estavam em guerras de libertação da matriz desde os anos 60, além do desprestígio causado pelas conquistas de Goa, Damão e Diu pela Índia. Portugal era integrante da ONU e da OTAN, mesmo assim era condenado por seus aliados, inclusive, pela sua política colonialista e ditatorial. O esforço de guerra colonial produzia um serviço militar de quatro anos de duração, repressão às opiniões contrárias à guerra, partidos e movimentos políticos, exílio de líderes da oposição e controle da imprensa e sindicatos. Todos eram suspeitos aos olhos do Grande Irmão português. A revolução de 25 de Abril de 1974 representa muito mais que uma mudança na história do Portugal. Ela é o marco do fim do ciclo imperial iniciado com a expansão marítima no século XV. A revolução portuguesa deu esperanças aos país latinos a lutar contra as suas ditaduras. No Chile havia sido imposto uma ditadura em nome da “liberdade”, “democracia” e “mundo livre” em 11 de setembro de 1973 com apoio do governo estadunidense. Ou seja, seis meses apenas antes da Revolução dos Cravos. O motivo da revolução é simples e pode ser resumido nos três dês: democratizar, descolonizar e desenvolver, que só seriam possíveis com o fim do salazarismo. António de Oliveira Salazar assumiu o cargo de Presidente do Conselho de 1932 até 1968. Governou o país com mão-de-ferro até a sua retirada por incapacitação física. Marcelo Caetano assume o seu lugar e mantém o regime por mais seis anos. Salazar tentou manter a todo o custo o fim do período colonial e dirigiu Portugal sob linha dura até a sua morte. Com a substituição de Salazar por Marcello Caetano, a expectativa pela liberalização do país aumentou, muito embora a demanda por mudanças superasse a meta do governo de fazer uma transição lenta, gradual e segura; para eles, obviamente. Nos anos 70, os portugueses estavam descontentes com a decadência econômica produzida pelo atraso da nação e do financiamento às guerras coloniais. Os setores de médio e baixo escalão das forças armadas estavam ainda menos satisfeitos com guerras inúteis e governos que não os representavam. Surge o “Movimento dos Capitães". Eles conviviam com o sentimento de exploração, antipatia popular e o medo de serem culpados por uma nova derrota nas colônias, assim como ocorreu nos territórios indianos. O Movimento cresce no verão de 1973/1974 e, desta vez, o povo passa a apoiar a causa dos militares como única via para acabar com o salazarismo. O regime de 48 anos cai quase sem derramamento de sangue em poucas horas com a adesão da população. O golpe não foi uma surpresa. Em 16 de março, oficiais de vários quartéis realizaram uma golpe frustrado contra o regime. O “putsch das Caldas da Rainha” serviu de ensaio para o golpe fatal contra o regime salazarista. Meia-noite e vinte minutos de 25 de abril de 1974. Neste horário era dada a senha para o início do fim. A Rádio Renascença executa “Grândola, Vila Morena” de Zeca Afonso, uma música proibida pela ditadura. Marcelo Caetano é “convidado” a se retirar e se exila no Brasil, que vivia os anos negros da ditadura militar. A população festeja o fim da ditadura distribuindo cravos, a flor nacional, aos soldados rebeldes. A revolução dos cravos teve três fases distintas. Até o golpe de 11 de março de 1975 não se sabia quem controlava o país. O general António de Spínola assume a Presidência e toma atitudes polêmicas como legalizar todos os partidos políticos, inclusive o Partido Comunista. As forças de esquerda ganham cada vez mais força no país e em setembro as MFA (Movimento das Forças Armadas) passa a dominar o governo. A MFA era influenciada pelo PCP. No mesmo ano de agitações políticas, as colônias africanas de Angola, Moçambique, Cabo Verde e Guiné-Bissau conseguem suas soberanias políticas. Era um desejo popular acabar com a ditadura, mas ao mesmo tempo era um golpe militar de fato. A peculiaridade aumenta com a segunda fase do golpe, iniciada pela tentativa frustrada de golpe de Spínola. O novo governo passa a ser controlado pelos generais Costa Gomes, Otelo Saraiva de Carvalho e Vasco Gonçalves. Depois do 11 de março o país começou a tomar de vez o rumo da esquerda. Bancos, indústrias e empresas de mídia foram nacionalizados, além do início da reforma agrária. Neste período é registrado uma migração em massa para o Brasil. Em menos de um ano, cerca de meio milhão de portugueses se mudam para o continente americano num novo processo migratório. A vitória do moderado Partido Socialista de Mário Soares nas eleições para a Assembléia Constituinte em abril traz um novo momento ao período revolucionário. Inconformados com esta reviravolta, oficiais de extrema esquerda tentam, sem sucesso, um novo golpe em 25 de novembro. Esta tentativa frustrada põe fim ao período revolucionário. Mesmo assim, a revolução portuguesa foi um marco para a redemocratização da península Ibérica e da América Latina. Ela foi decisiva para as eleições que trouxeram derrotas aos governos “democráticos” no Brasil e em outros países latino-americanos sem cheiro nem sabor. A revolução mudou de vez a vida dos portugueses. A Carta Magna de 1976 incluiu temas sociais, garantiu o processo de reforma agrária e a independência das colônias. No mesmo ano, o general António Ramalho Eanes é eleito presidente da República. Este foi o mesmo comandante que esmagou a rebelião de oficiais de esquerda. Com a derrota, Mário Soares tem de governar com a minoria no congresso. Em 1978 renuncia ao cargo devido a grave crise econômica. Mesmo atravessando instabilidades políticas, como a do fim da década de 70, a democracia sobreviveu em Portugal com a alternância entre os partidos de direita e esquerda. Atualmente, os portugueses comemoram o 25 de abril como uma data que fez o país renascer do obscurantismo e do fascismo. Especial A Revolução dos Cravos - 25 de abril de 1974
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